“O uísque é o melhor amigo do homem. É o cachorro engarrafado.” Uma das citações mais famosas atribuídas ao poeta e compositor Vinícius de Moraes (1913-1980) ilustra sua conhecida simpatia pelo destilado. Essa também era a bebida preferida do escritor americano William Faulkner (1897-1962), que sempre tinha uma garrafinha ao alcance das mãos. “Eu normalmente escrevo à noite, e por isso mantenho o uísque por perto”, dizia. O Poetinha e Faulkner, que faziam do uísque companheiro da boemia e na hora de compor verso e prosa, nunca estiveram muito isolados na preferência.
Com mais de 500 anos, o uísque é um dos maiores clássicos de balcão. Dá a volta ao mundo em consumo e produção. Os cinco maiores produtores são, pela ordem, Escócia, Estados Unidos, Irlanda, Canadá e Japão. "Na Escócia, o uísque só perde para o petróleo em termos de importância econômica", diz Cesar Adames, especialista em bebidas.
Este último importou da Escócia a tecnologia de fabricação, há mais de 100 anos. Aprendeu bem, pois o uísque japonês Yoichi 15 anos, produzido em Hokkaido pela Nikka Whisky, chegou a ser eleito o melhor do mundo pela revista inglesa Whisky Magazine. Trata-se do primeiro single malt não escocês a vencer a eleição. Outro japonês, o Suntory Hibiki levou o mesmo prêmio, só que na categoria blended. Na avaliação, dezesseis especialistas fazem degustação às cegas de 200 variedades de uísques.
Será que Vinícius, Faulkner e Harris preferiam blended (mistura de variedades de uísque malte de várias destilarias) ou single malt (feito apenas com malte de uma destilaria)? Puro ou com água? Torceriam o nariz se vissem alguém misturar a bebida com club soda?
Os brasileiros estão bebendo mais uísque
A Whisky Magazine diz que o Recife tem o maior volume per capta de consumo da bebida no mundo. Na avaliação da revista, existe uma cultura de beber “casualmente como forma de socialização em momentos de lazer e na praia, com gelo”.
Segundo Eduardo Rotella, embaixador do escocês Chivas Regal no Brasil, as pessoas mais jovens tendem a consumir uísques do tipo blended e com menos idade (standard). “Nesses casos, predomina o jeito de beber pernambucano: com gelo, água de coco e até energéticos. É uma questão de custo e de paladar, que também é jovem e ainda não tem parâmetros para uísques mais maduros e complexos”.
O Brasil importou da Escócia, em 2009, 41 milhões de garrafas de uísque – 14,8 milhões a mais que em 2008. O crescimento colocou o país em sétimo lugar no mercado de consumo mundial do chamado scotch uísque, o uísque escocês.
O que é uísque
É um destilado. Só pode ser chamada de uísque a bebida feita da fermentação e da destilação de cereais como cevada, milho, trigo ou centeio e envelhecida em barril de carvalho por no mínimo três anos (padrão escocês) e dois anos (americano). A gradação alcoólica começa nos 40%. “A escolha do tipo de cereal e a combinação ou não entre eles define se o uísque é, por exemplo, um single malte escocês ou um bourbon americano”, explica Cesar Adames.
A origem data da década de 1490, século XV, e é disputada desde sempre por irlandeses e escoceses e nem mesmo os maiores especialistas no assunto se arriscam a cravar um vencedor. “O nome uísque vem do termo gaélico uisge beatha, que significa água da vida. Uma denominação já usada antes para processos de purificação, como o dos vinhos”, diz Eduardo Rotella.
Seja qual for a origem – Escócia, Irlanda, Estados Unidos, Canadá, Japão... – são sempre as mesmas variáveis que interferem no sabor final da bebida. O jeitão do uísque é determinado por clima, solo, madeira (do barril em que for envelhecido) e, principalmente, da água usada na fabricação. “A água é, sem dúvida, essencial, mas é a junção de todos os outros fatores que traz características únicas para a bebida”, pontua Rotella. Na Escócia, por exemplo, que tem as melhores condições para a fabricação da bebida, o solo é rico em minerais e oferece águas diferentes e muito puras. A qualidade da água é determinante para o resultado. Já o clima frio e úmido e a constante presença da névoa favorecem a qualidade da cevada.
Whisky, só na Escócia
A denominação scotch whisky só pode estar impressa no rótulo quando a bebida é feita na Escócia. Nenhuma destilaria de outro país pode usar a nomenclatura, mesmo que importe o malte escocês. Os preceitos da fabricação do scotch incluem a utilização de barris reaproveitados, com uma madeira já desgastada, que libera menos sabor na bebida. Na Escócia, só é considerado uísque a bebida que tiver no mínimo três anos de guarda.
Existem quatro tipos de uísque escocês:
Single malt: feito exclusivamente de malte de cevada, sem nenhum tipo de mistura. É fabricado em apenas uma destilaria, mesmo que incorpore uísques de idades diferentes. Em termos de sabor, é marcante, forte e encorpado. Deve ser bebido puro. Gelado ou não.
Vatted malt (blended malt): dois ou mais (às vezes dezenas) single malt de diferentes destilarias são combinados. Também tem sabor forte e mais encorpado em relação ao blended de cereais. Deve ser bebido puro. Gelado ou não.
Grain whisky (blended): produzido com cereais como milho, trigo e centeio. É o uísque de produção industrial, mais simples, barato e leve.
Blended scotch: é o mais popular. Resulta da combinação de vários uísques de malte de cevada e de grão. Os blended correspondem a 90% do mercado mundial, segundo a Scotch Whisky Association. Podem ser consumidos com cubos de gelo e club soda.
Fora da Escócia, whiskey
Fora da Escócia, whisky é whiskey. Nos Estados Unidos, segundo maior produtor, a bebida chega com a colonização da América, por volta de 1500, quando irlandeses e escoceses ocuparam a Virginia. Por causa de altas taxas de impostos, a produção foi empurrada para o centro do país. O Tennessee é um dos lugares que a partir de então levariam adiante a cultura do uísque.
O plantio do milho em grande escala foi decisivo para a introdução desse ingrediente à bebida. “Para receber o nome de bourbon e tennessee whiskey a regulamentação americana exige um mínimo de 51% de milho na receita, sendo que alguns fabricantes chegam a entregar 75%”, explica Cesar Adames. Até aí, os dois são iguais. “A diferença reside no processo de filtragem. O tennessee whiskey passa pelo filtro de carvão o que dá uma leve diferença no sabor”.
Tennessee whiskey: parte do mesmo destilado de milho que o Bourbon, mas é filtrado num tonel de carvão quatro metros de altura, num processo que se chama charcoal mellow e que lhe confere um sabor um pouco o mais suave.
Bourbon: sai da destilaria e vai direto para o barril. É importante lembrar que a lei americana diz que os barris devem ser sempre novos, feitos de carvalho branco. Essa lei é exclusivamente americana, onde prevalece a utilização da madeira virgem para dar sabor ao uísque. Os americanos não envelhecem o uísque por muitos anos como os escoceses. A maioria dos uísques americanos tem em média um ano de guarda.
Puro ou com gelo?
- Adicionar gelo ao uísque é um costume muito comum em países tropicais como o Brasil. O modo escocês de consumir a bebida, no entanto, estabelece uma diferença. Primeiro, faz mais frio por lá então eles preferem beber puro, especialmente o single malt, que tem sabor mais acentuado. Nele, os escoceses nunca colocam gelo. No caso do blended, que tem malte de vários grãos, o gelo ajuda a abrir os diversos buquês da mistura. Isso não é uma regra. Depende do gosto de cada um.
- Tem gente que gosta de colocar água na bebida. Para isso, existe uma espécie de ritual: primeiro o gelo, depois o uísque e, por último, a água – na medida para não descaracterizar. Tudo isso em um copo alto. A ordem faz com que o uísque derreta o gelo diluindo-o e diminuindo a temperatura da bebida. Também é visto por aí o uso de blended em drinques. No Brasil, água de coco, frutas, energéticos e refrigerantes são ingredientes encontrados nesses coquetéis. Qualquer líquido entra depois do gelo e da bebida, para ficar mais fácil de dosar.
- A garrafa de uísque pode ser armazenada em qualquer posição: deitada, em pé, de lado ou até de ponta-cabeça. Mas deve ser mantida em locais onde não haja incidência de sol, nem luz direta.
- Depois de aberta a garrafa, a tampa deve ser bem fechada. Se ficar entreaberta o álcool vai embora e, junto com ele, o sabor.
- A temperatura ideal para a conservação do uísque é bem elástica: o local deve ficar climatizado entre 5º C e 40ºC.
- Não é comum harmonizar uísque com alimentos, mas vale arriscar algumas combinações. “Para uísques mais suaves, chocolates amargos. Já para os mais salgados, maturados em cidades marítimas, o ideal são combinações com peixes e frutos do mar. A maioria deles, combina com castanhas, frutas secas e sabores picantes”, anota Eduardo Rotella.
- O envelhecimento é considerado a parte mais importante na produção do uísque. A cor, a suavidade e o buquê são adquiridos com a maturação em barris de carvalho. Por isso, quanto mais velho, melhor e mais caro – lembrando que a idade não é fator isolado da qualidade.
- A idade do uísque deve sempre estar estampada no rótulo. No caso do blended, que é composto de vários uísques na mesma garrafa, vale a quantidade de anos do mais jovem, entre todos os de malte e de grão. Com a idade os uísques se classificam em standard (até oito anos), premium (acima de oito anos) e super premium (acima de dezoito anos).
- Só o Brasil utiliza o critério “oito anos” para classificar os scotch de categoria standard. A terminologia “oito anos” não existe oficialmente. Não há rótulos marcados assim. O nome correto é standard. Isso porque a idade do uísque impressa no rótulo, no caso dos blendeds, corresponde sempre à idade do malte mais jovem presente na mistura daquela garrafa. E a maioria dos standards misturam uísques de 3 a 5 anos. Ou seja, uísque oito anos é uma licença poética dos brasileiros.
- Alguns países, inclusive o Brasil, recebem lotes de uísque com conta-gotas, uma espécie de bico dosador que funciona como lacre para evitar que a bebida seja adulterada ou diluída antes de chegar ao consumidor final
- A Organização Mundial de Saúde (OMS) estipula que o consumo diário de álcool não pode superar 30 gramas, o equivalente a uma dose de uísque que tem teor alcoólico de 40% ou mais.
- Na Escócia, quando se brinda com os amigos, diz-se “Slainte Mhath”. Essa expressão sintetiza o significado de várias outras: saúde aos amigos, saúde ao Rei, saúde às terras do Rei e saúde ao Rei de todos os Reis.
- É um costume escocês, quando os amigos se encontram para beber uísque, deixar um copo de água sobre a mesa. Todos brindam passando seus copos por cima do copo de água, que representa o Rei ausente, Prince Charlie Stewart, que havia se refugiado, em 1745, na França. É o brinde chamado “King of the water” (Rei da Água).
Doze bons uísques que custam entre 65 e 3 500 reais
Escoceses
Ballantines Finest – Uísque feito com malte escocês e engarrafado na Escócia. Foi Considerado o melhor blended whisky pela Whisky Bible em 2009. É envelhecido em barris de carvalho por pelo menos três anos, tempo em que adquire sua cor dourada e onde acontece a troca de gases com o ambiente.
Graduação alcoólica: 40%
Preço médio: 65 reais
Famous Grouse – Outro blended whisky, o número um em consumo na Escócia. É feito da mistura de maltes e grain whiskys prestigiados como Macallan e Highland Park. É envelhecido em tonéis de carvalho por um período mínimo de oito anos. A tonalidade é âmbar e o sabor ligeiramente frutado.
Graduação alcoólica: 40%
Preço médio: 70 reais
Chivas Regal 18 Years – Ótimo blended whisky criado pelo master blender Colin Scott. Tem aroma suave e sabor esfumaçado, adquirido no envelhecimento em barris reaproveitados de Jack Daniels. Considerado umas das melhores relações custo benefício entre os uísques escoceses tem cerca de 3 milhões de caixas vendidas por ano no mundo.
Graduação alcoólica: 40%
Preço médio: 200 reais
Talisker 10 anos – Um single malt escocês conhecido pelo seu sabor picante e levemente salgado obtido através da utilização de turfa, espécie de vegetal absorvente de outros materiais químicos, na sua produção na ilha de Skye.
Graduação alcoólica: 45,8%
Preço médio: 240 reais
Macallan Cask Strenght – Single malt escocês muito nobre amadurecido em barris de carvalho selecionados por onde já passou o vinho espanhol Jerez, que empresta sabor a bebida. É um dos mais potentes single malt do mercado.
Graduação alcoólica: 58,6%
Preço médio: 300 reais
Glenmorangie Nectar D’or – Este Single Malt escocês passa por uma segunda maturação em barris pelos quais passaram o vinho de sobremesa francês Sauternes.
Graduação alcoólica: 46%
Preço médio: 400 reais
Macallan Elegância 12 – Macallan é considerado o Rolls Royce dos uísques escoceses, por isso aparece duas vezes nesta lista. O Elegância 12 anos é um exemplo de fineza e requinte destes single malts.
Graduação alcoólica: 40%
Preço médio: 400 reais
Chivas Regal 25 Year Old – Lançado recentemente é um blended escocês que reúne os uísques envelhecidos por no mínimo 25 anos. Cada garrafa é numerada individualmente, o Brasil recebeu um lote de apenas 25 caixas. Tem 43% de álcool, preço médio de R$ 1.500.
Graduação alcoólica: 43%
Preço médio: 1500 reais
Royal Salute 38 anos – Stone of Destiny - Edição produzida em pequenas quantidades em garrafa de porcelana fabricada a mão e carrega uma insígnia folheada em ouro 24 quilates. É um uísque suntuoso e encorpado com notas ricas de cedro e amêndoa moída, com um toque de carvalho e xerez. No paladar persiste uma sensação forte e picante de frutas secas. O Brasil recebeu 100 garrafas que estarão disponíveis apenas em São Paulo, Ribeirão Preto e Brasília.
Graduação alcoólica: 46%
Preço médio: 3500 reais
Estados Unidos
Jack Daniels – É o mais vendido da sua categoria no mundo, a dos Tennessee Whiskeys e também um dos uísques mais vendidos entre todos. O seu diferencial se deve ao processo de destilação. Os barris virgens dão o sabor amadeirado à bebida. O tempo para chegar ao ponto certo é definido por experimentação e varia de seis a oito anos.
Graduação alcoólica: 40%
Preço médio: 100 reais
Maker’s Mark – É o champagne dos Bourbons produzido em Loretto, Kentucky. Tem a linha de engarrafamento mais lenta do mundo por conta do seu acabamento em cera vermelha, uma garrafa nunca é igual à outra.
Graduação alcoólica: 45%
Preço médio: 120 reais
Irlanda
Tullamore Dew – Uísque irlandês descoberto recentemente que passa por três destilações e tem um sabor mais encorpado que os tradicionais Irish Whiskey.
Graduação alcoólica: 43%
Preço médio: sob consulta
Bebidas alcoolicas são proibidas para menores de 18 anos. Se beber, não dirija.
domingo, 9 de maio de 2010
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